quinta-feira, 5 de abril de 2012

Coca-Cola: por um mundo melhor

Li no jornal Público algumas conclusões do RASI de 2011. Parece um nome indiano, mas não, é o Relatório Anual de Segurança Interna. Constatam-se factos e analisam-se resultados. Resumidamente a criminalidade baixou residualmente relativamente ao ano anterior (2%), com destaque, na baixa, para o crime violento. 

Aumentaram os delitos menores, por esticão e assaltos a ourivesarias. Um sinal claro da crise e dos seus efeitos. É preciso liquidez imediata, não há tempo para engendrar grandes esquemas, com homicídios pelo meio, correndo-se o risco de não se sair tão cedo de uma cadeia sobrelotada, onde, ao que parece, grande parte são estrangeiros, que enganados ao que vinham, tornaram-se violentos. Ser violento é relativo. Está dentro de nós, faz parte da nossa natureza, só que está adormecida. Experimente-se não dormir, ou mal, durante muito tempo, junte-se-lhe fome, ruído, saturação física e psicológica, desespero, luta pela sobrevivência, pânico e… é vê-la acordar.

Tal como noutras coisas neste país, também nos crimes, ou na violência se assiste a um desequilíbrio de distribuição geográfica. Porto e Lisboa têm as maiores fatias e o resto é paisagem. Ou quase. Na paisagem destaca-se Setúbal, não só pela beleza natural, mas porque completa juntamente com as capitais os 75% do crime português.
E, ao contrário das capitais, no distrito subúrbio a tendência é de crescimento, em especial dos ilícitos de natureza violenta e grave. Curiosa esta distinção para Setúbal, qua analisando bem deverá ser o distrito com mais concentração de bairros sociais do país. Um autêntico barril de pólvora. Mas não deixa de ser um luxo para o bandido, ter uma capital mesmo ao lado que o “emprega” e, no seu território, tantos mil metros das melhores praias do país para disfrute nos imensos tempos livres. Um luxo. Se eu fosse bandido também era capaz de escolher o distrito de Setúbal para exercer actividade. Não o sendo, no meu papel de potencial presa, recordo-me de vir na rodoviária pela N10, de Setúbal para Almada, após a entrega da candidatura para a universidade, com o autocarro quase vazio. O quase era um pseudo cowboy com um revólver que parecia limpar.

Já lá vai o tempo, quase 20 anos. Nessa altura estas histórias de gangster eram excepção. Para a praia, íamos uma dezena num carro, deixados na Caparica durante uma manhã por conta própria. Não havia telemóveis. Havia relógio para estar à hora combinada para a boleia de regresso. Não havia medo! Dos acidentes na via-rápida. Da polícia no trânsito. Do mar, do sol, dos olhares e das gentes da praia. Dos assaltos. Hoje, é mais violento jantar em casa com o telejornal no ar. Aterrorizador para qualquer criança. Nas escolas surge a ideia de separar os bons dos maus. Má ideia. O Bem e o mal sempre coabitaram. Complementam-se e contribuem para o equilíbrio e crescimento pessoal. A seguir vão-se alterar os contos infantis. Pega-se no lobo mau, na bruxa, no ogre, no monstro e na madrasta má, e metem-se num comboio a caminho de um campo de concentração. Ficam os 3 porquinhos, os cabritinhos, o Capuchinho Vermelho, a Branca de Neve, o João pé de feijão e a Bela a viver em harmonia e paz. Até o dia, em que os 3 porquinhos ficam fartos de se aturar na mesma casa, os cabritinhos querem comer o pé de feijão, o João os cabritinhos, mas também a Branca de Neve, e a Bela e o Capuchinho insultam-se com ciúmes. Alguém se passa da marmita e ganha um bilhete de comboio. Por mais que se tente controlar, há coisas que não se controlam. Os contos infantis serão sempre como os conhecemos. Violentos q.b.

Ainda o RASI e por fim um dado curioso que me dá jeito para finalizar, diminuíram os crimes de violência doméstica e os sexuais, o que equivale a dizer que em tempos de crise entendemo-nos no aconchego do lar. Por isto e tudo o resto, não interessa agredir e acusar, importa sim, fazer as pazes e como ficou provado pelos fregueses é possível haver grandes manifestações sem violência. Posso estar a ser lírico, lamechas, ingénuo, acomodado, choninhas, mas quando vi o anúncio que se segue pela primeira vez, parei em frente à TV. Continuando na onda estatística e aproveitando a deixa da revista Maria (sim, não é só nos jornais intelectuais que se aprendem coisas, nestas revistas há muitos bons ensinamentos para a vida) que refere que até fazemos mais sexo que os outros, acrescento mais uma frase ao filme publicitário da Coca-Cola - "por um mundo melhor": por cada um que comete um acto de violência, há não sei quantos mais que fazem amor! E siga a dança!

PS: E não é que a dança seguiu mesmo... para a hora do almoço? Nem de propósito. Uma moda sueca: dançar na hora do almoço. Parecida com esta só me lembro da do lusco-fusco. Está no espírito. Duvido que alguns voltem para o trabalho na parte da tarde.

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