segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Todos ganham com as eleições

O PàF. Ao contrário do marketing do PS, a coligação foi um verdadeiro caso de sucesso, a começar pela sigla: um “a” minúsculo com acento grave no meio de um “P” e um “F” maiúsculos. Super moderno, só faltou um “#” ao início.
“Está disposto a votar no PàF nas próximas eleições?”
“Sim…”
“E na coligação PSD/CDS?”
“Esses ladrões? Nem pensar!”
O PàF nem sequer é um partido, que os partidos não valem nada. O PSD e o CDS estão gastos, usados. Um coligação é diferente e o que está a dar são parcerias.
O PàF é como um novo smartphone, muda o visual mas a trampa é a mesma. Conclusão: vai tudo a correr comprar, 2 milhões e qualquer coisa de votos.
O PS, desgastado e velho precisa definitivamente de novo diretor de marketing. O líder pode ser o mesmo, pouco importa. E já agora mudem também de hotel, um que tenha ar condicionado nas salas comuns. Já é suficiente mau ver o Costa na TV, muito pior ver o Costa a pingar de suor. Parecia que tinha acabado de comer uma chamuça. Isso dá para ver no booking.
Mas nem tudo foi mau para o PS. O PS foi o partido, que mais deputados ganhou relativamente às últimas legislativas (2011), mais uma dúzia: PS! PS! PS!
O Bloco ganhou com as mulheres, uma despida até. E a percentagem arrebitou mais do que qualquer outra: 5% relativamente a 2011, o que valeu a chegada ao pódio.
Sobe a Catarina, desce o Jerónimo. Embora tenha também ganho. Mais um deputado do que em 2011. Cresceu mas não arrebitou, com o Jerónimo também não dá para mais.
Por último, o PAN, passou de zero para um deputado, obviamente também ganhou.
Maiorias nem vê-las. A abstenção se fosse um partido teria a absoluta, ganhou também 2%. É uma ideia a explorar: vote no "eu quero lá saber disso para alguma coisa!".
Maiorias há muitas. O Cavaco se quiser sair em grande, pode sempre apostar nesta: PS(85)+BE(19)+PAN(1), 105 contra 104 (PàF) deputados. Para que os verdadeiros e fieis animais possam fazer a diferença.
Ganham todos, perde o mesmo de sempre.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

A bananização da violência


Ainda não percebi se há mesmo mais violência, ou não. É comum ouvir-se dizer, sempre foi assim, agora é que se ouve falar. Diria antes, agora é que se vê. Proliferam câmaras e canais de televisão. Até de altíssima definição, infinidades de mega pixéis na palma da mão, com transmissão de híper-difusão. É tudo alta, mega, híper, super, fixe. Hi-tec, mainstream, brutal!
Mas não nos melhora, não nos mostra melhor, antes pelo contrário.

Será bom? Parece mau, parecemos péssimos, da pior espécie. Desumanos da pior espécie, se é que dúvidas ainda subsistiam. É tão simples, ou parece tão simples como cortar uma banana às rodelas, como carregar num botão. Start/Stop. Automático sem preocupação. Virar costas e ir embora.

Será bom? Temos que ver para evoluir, perceber o que há a corrigir? Há que mostrar, sem medos, há conteúdos para preencher, páginas para exibir, gostos para conquistar, audiências para aumentar. Porque queremos ver, viciam-nos em ver. Só vê quem quer, quem não quer, não vê, nada. Mais também não há para ver. E ai de quem não vê! É um banana! E os bananas, são comidos, apanham, levam bananos.

A violência está tão banal como comer uma banana. A própria violência em si, é banana, cobarde, no sentido em que se revela e sobrepõe a um baixinho intelecto. Há que bani-la! E é aqui que podia entrar um movimento social. Pena não ter audiência, porque se tivesse era já: “Armas por Bananas”. Queria ver alguém a espetar uma banana, disparar uma banana, sovar ou infligir com uma banana, arremessar bananas. Brincadeiras à parte, pois a fruta não é para brincar é para comer, que esta era global, digital, de omni-informação, esteja apenas nos seus primórdios e a reavivar a noção de que a violência é real, que permita aprender, educar, transmitir para evoluir, não para oprimir e banalizar, quanto muito, e sem me querer repetir, para bananizar.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Pires de caracóis

Nota: Expresso Curto é a newsletter diário do Expresso, vale a pena.
 
Começo o meu expresso curto com um pires de caracóis, que é como quem diz, meia dose. Para não demorar muito. Expressos, cafés ou bicas, curtas, italianas, cheias, pingadas ou com cheirinho, tirei muitas na adolescência. No café, snack-bar, cervejaria, pastelaria, restaurante, o estabelecimento familiar tudo em um, tão em voga nos loucos anos 80 e 90. Tudo era lucro porque trabalhar, mais do que sol a sol e ter que dar ao fisco era um absurdo. Conheço bem, compreendia e aceitava as motivações da economia paralela. Percebo agora melhor ainda, a importância da fatura com NIF.
 
A SIC fez ontem as contas. Para a liquidação do IRS de 2015, em 2016, conta tudo, dentro dos respetivos limites, desde que com fatura e NIF. Nada mais lógico e natural. Assim os contribuintes vão fazendo o controlo no site das Finanças, e a famosa máquina fiscal consiga ter tudo integrado. Para todos, e que principalmente os grandes grupos económicos não fiquem de fora, ou será que, por exemplo, sistemas de faturação como o do Continente (em tempos?) isento de certificação fiscal por decreto-lei á medida, continuarão a vigorar?

Importa saber de onde vem e de quem é o dinheiro. De Sócrates ou do amigo Silva? A defesa defendeu-se, mas continuam as dúvidas.

Dúvidas, dívidas e caracóis novamente da inevitável Grécia. 10 ministros novos. O já destacado ministro das finanças grego Varoufakis. Antigo professor e também aluno. Terá sido bom ou mau aluno? Terá feito o exame de professor com erros ortográficos? E erros de matemática? Terão sido feitas as contas aos 28% de aumento do salário mínimo grego? 171 euros a juntar aos 580! Arrisco dizer, sem ser economista nem financeiro, que serão centenas (milhares?) de milhões de euros entre o deve e o haver, no que tem que se pagar a mais, no que se tem que isentar, ou nos subsídios que têm que se atribuir. Não é uma bazuca, mas não deixar de ser um belo obus. Um abuso. Se dúvidas ainda há do que este Syriza poderá vir a fazer, pela amostra, promete.
 
Em sentido inverso, os bancos gregos cotaram menos 25%. A troika e os mercados enervaram-se. Talvez seja melhor um calmante. Para os portugueses, atenção aos genéricos. Afinal parece que alguns são também eles duvidosos.

O melhor será tomar o expresso com uma 1000, 9 e 20, uma CR&F, aldeia velha ou S. Domingos. Vodka nem por isso. Imagens ontem da humilhação russa aos prisioneiros de guerra ucranianos. 70 anos depois do horror máximo inimaginável, os exemplos continuam, sejam eles americanos, muçulmanos ou africanos. Continuamos uma espécie reles incapaz de evoluir. A Europa e o Mundo mais do que velhos, estão decrépitos. Talvez por isso se tentem descobrir, novos mundos, sois e sistemas solares. Os portugueses lá fora descobriram 5 novos planetas. Pelos vistos, tão velhos como o big bang.

Big bang, big ben. Tudo gira à volta do tic, tac. A passada, o binário digital, o batimento cardíaco, o motor, o amor, o sexo. 50 sombras de Grey de qualidade duvidosa, em estreia no cinema, o dia dos namorados, o salão erótico de Lisboa e o carnaval, tudo no mesmo fim de semana, no fevereiro que aí vem. Vai ser o forrobodó! É esperar para ver, por certo o próximo mês não ficará atrás deste marcante janeiro.

O que eu ando a ler:

Sherlock Holmes. Para desanuviar e entreter. A astúcia, capacidade de observação, destreza de raciocínio, inteligência e fantasia que tão bem podem ser aplicadas, com o devido desconto, na vida do dia-a-dia.

Não estou ainda a ler, mas vi ontem na montra da livraria Apolo 70, a história do Endurance - Encurralados no gelo. A comprar.

Há também quem leia lábios. Mas isso fica para mais adiante.

Frases:

"Nunca mais faças isso dentro da área c..., tu vai para ... pá!". A culpa nem é do Eliseu, que tem feito jus ao seu nome de avenida francesa, tal é a facilidade com que os adversários desestabilizam o Benfica pela sua ala. A culpa é de quem tira um André Almeida, na melhor fase da época do Benfica. 700 e muitos minutos sem sofrer golos, mas o miúdo, que até também é dos preferidos do Jesus, desde os tempos do Belenenses, teve que sair para entrar a primeira escolha do treinador.

"Na Taça da Liga, só com juniores". Talvez por isso, tenham deixado a decisão do apuramento para as meias-finais com o Benfica, na mão de terceiros, neste caso o Belenenses e o Vitória de Setúbal, curiosamente os últimos a não perder com o leão.

Por falar no leão, Figo na FIFA, tem musicalidade...

sábado, 24 de janeiro de 2015

Maus alunos II - O regresso do bife.

- Pedro e Paulo, estão aí?
- Mário, és tu?
- Saiam de trás da moita, tenho aqui uma arma nova!
- Estava a ver que não! Isto de caçar, contribuintes, pensionistas e carroças velhas, com pouco mais do que fisgas… é duro, já não tem piada.
- Uma bazuca!
- Boa Mário, quer dizer que temos sido bons alunos?
- Não. Quer dizer… sim… ou melhor, não. Sei lá!!
- Agora é que vai ser caçar!
- Errado, Pedro. Isto é para espalhar o bem!
- Como? Estou confuso. Percebeste Paulo?
- Ah… Não sei. Vou ligar à Maria que ela deve saber.
- À Maria ou à Manuela?
- Prestem atenção. É uma bazuca de notas. Em vez de tirarmos, vamos começar a dar.
- Mas… vamos continuar a disparar?
- Sim, e saem notas. É tecnologia americana, da mais avançada.
- Deixa-me ver se percebi, apontamos às pessoas e… toma lá euros. Será que é isto Pedro?
- Em notas, que moedas talvez aleije.
- Não, às pessoas não. Apontem aos bancos, que eles depois dão às empresas… até que há-de chegar às pessoas. Agora…
- ahahhah, ehehehe, ihiihiih, ohhho, aaahhh.
- eheh.
- Qual é a piada?
- bahahhah, eh, ihiihiih, ohhho, aaahhh.
- eheh… para Mário, não aguento mais.
- Não percebo, o que se passa?
- Nada, nada!
- Já agora podemos criar um novo banco?
- Claro que não, isso não é assim, de um dia para ou outro. Um banco tem que se construir em bases sólidas, passar por vários anos de supervisão e parâmetros apertados.
- Sim tens razão.
- Como eu dizia, agora é que vamos crescer!
- Então vá deixa lá a bazuca, as munições e podes ir Mário.
- Ciao. Cuidado com a bazuca, Pedro e Paulo. Já pensaram em fazer um dueto? Pedro e Paulo, Paulo e Pedro…
- Adeus, adeus, vai lá à tua vida, ó Mário.
- Eu vou mas tenham cuidado, que os estilhaços, provocam aumento dos preços, do gasóleo e tal.
- Eu sabia que isto não podia ser só dar! Mas ok, melhor do que nada, assim, sim. Oh Pedro não achas?
- Não sei não, então até agora foi sempre a tirar, e de repente vamos dar… aos bancos? As pessoas vão perceber?
- Pedro, nós tirámos-lhes, se agora lhes enchêssemos os bolsos, sem mais nem menos, aí sim ficavam confusas, sem saber o que fazer ao dinheiro, capazes ainda de irem esbanjar à toa. Assim não.
- Olha, abre mas é uma lata de sardinha e uma mini para comemorar.
- Sardinha? Vai ser é um bife! A ideia não é crescer? Sempre ouvi dizer que peixe não puxa carroça.
- Se há coisa que me faz confusão, é o pessoal estar sempre a querer crescer. Se crescêssemos sempre, qualquer dia não cabíamos cá.
- Tínhamos que ir para Marte.
- Bem visto! Mas isso é caro.
- O que vale é que querem, querem, mas não crescem nada de jeito. Querem, mas não sabem como, depois inventam. A seguir vem o quê? Uma bomba?
- Bora, vamos ao Talho!
- Talho? Depois ainda temos que fazer o bife e o molho.
- Não pá! Há um restaurante…

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Somos Ronalde!

A formação até é boa (ou era) mas o estágio profissional bem remunerado é lá fora, em Inglaterra, por exemplo. O sucesso mora aqui ao lado, na terra de nuestros hermanos. Lá têm condições. Lá podemos. Aqui somos podados. Gasolina mais barata, bons ordenados, bons empregos, boas empresas, boas terras. Reis, raínhas, princípes e princesas. É o paraíso. O melhor e maior clube do mundo (e o Benfica, pá?!), a melhor liga de futebol do mundo, o segundo melhor jogador do mundo no segundo melhor clube do mundo. E o 1º de dezembro continua a ser feriado?

O Ronalde é que sabe, até o grito de guerra foi espanhol! Mas ok, discursou em português, e bem, para quem quis ouvir. Falou, pronto. Quem não deve ter gostado de ouvir, foram os germânicos, já se preparavam para fazer o pleno, com um Manuel qualquer que vai à baliza, para juntar ao Joaquim macacudo e tiveram que levar com um periférico. Toma também incha Platini! Menos, que os hommes estão sensíveis: toma (só) Platini!

Três, hã!? Nem uma nem duas, são três bolas. Não foi à toa a protuberância na estátua. Possivelmente até já lá está embutida a prometida quarta. Se não está, embute-se para o ano, não seja por isso. A Irina até foge! Foi como hoje, nem vê-la. Mas é assim, mulher não é chamada para as cenas da bola. A não ser a mãe.

Agora a sério, parabéns, és sem dúvida enorme. Há mais alto, mas em termos de projeção internacional de Portugal sem ser pela avaliação económico-financeira de lixo, melhor do que tu não há. Vamos à quarta. Só é pena que o resto da malta não te consiga ajudar. Nem nós aqui, nem os teus coleguinhas de seleção que já devem estar bem fartinhos de ouvir que o bom és tu e os fraquinhos são eles. As verdades são para ser ditas, não há como contrariar quem tem um museu como o teu. Vão mas é trabalhar (se ainda têm trabalho)!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Canetas contra canhões


Um dia igual aos outros. A caneta vai escrever, marcar o papel branco, transformar o vazio, magicá-lo em realidade. Os traços vão saindo, a forma forma-se, a obra nasce. Tudo está calmo, sereno, normal, só se ouve o silêncio da escrita. Repentinamente a caneta estremece, sobressalta-se, a forma deforma-se, mas sobrevive, mesmo que desprogramada e subvertida. O alarme desperta e acorda Charlie em vigia.
Do outro lado da janela, os passos são firmes, autómatos, basilares, sustentáveis de um peso. O dos canhões em riste, do dedo embrutecido no gatilho, o olhar cego, maquinalmente seletivo e morto. O punho negro empurra a porta, nem bom dia, nem boa tarde, o dedo embrutece-se apenas mais uns milímetros e o mecanismo é acionado. Energia irreversível, combustão, clarão, estrondo ensurdecedor, o cano é percorrido, uma e outra vez. As balas rastilham o ar.
Ninguém se mexe, apenas se pensa. Os olhares fixam-se na agressão. Os estiradores abrem-se em escudos, as balas esbarram, outras passam, mas logo são abertas ao meio, numa precisão métrica infinita de folhas de papel supercortante. Dividem-se, desunem-se e caiem no chão num tilintar inofensivo. Nuvens cinzentas esboçadas no ar por lápis de carvão ofuscam a visão. As rajadas param.
Bisnagas de tinta esguicham, e os esguichos trespassam a cinza, entrelaçam-se num tronco grosso, dois ramos com mãos nas pontas formam-se e seguem na direção dos dois. Apanham-nos, imobilizam-nos, seguram-nos, elevam-se, rompem telhados e esticam-se, subindo pelo céu até ao limite do respirável, até à fronteira da morte.
A tinta de azul elétrico, irradia luz, ofusca a torre Eiffel, torna-se visível, todo o mundo a vê, milhares de metros e litros depois liquidifica-se por completo e colora o planeta numa chuva de artifício. Sem chão, os dois pares de olhos esbugalham-se. Contudo, mal vêm o mundo lá em baixo. O espaço para, o instante é breve. A queda é vertiginosa, as armas libertam-se, desintegram-se e esfumam-se na atmosfera. As vestes rompem-se, libertam-se, esfarrapam-se e balançam como folhas. Os corpos seguem incontroláveis, sugados para baixo, a velocidade é absurda, e o ar falta, mas a terra e o chão sólido e tangente estão fatalmente próximos. Não vai doer. Será fulminante. As almas seguem presas. As pálpebras fecham.
As canetas agrupam-se, no exterior, em círculo, de bico para o centro, e começam a debitar letras, que se encaixam e criam uma rede. Os olhos continuam fechados, o medo do violento e exterminante embate apodera-se, mas eis que se abrem pela captura leve e subtil da rede. As canetas apontam para baixo. A rede desmancha-se e as letras caiem no chão ao redor dos dois. Nus, despidos, depilados, limpos, indefesos, rendidos. Mas não redimidos. O olhar pasmo logo se enraivece, as canetas embicam novamente ao centro. E disparam!
Letras. Penetram no crânio, sem dor. Marcadores injetam cor. Sem dor. Lápis definem traços. Sem dor. Pinceis pintam roupas e artefactos. Sem dor.
Os dois, entreolham-se, sem capuz libertam-se. E vão comprar o jornal.

Embora assim não pudesse ser, também não se acredita que assim tenha sido. Foi. Imaginado também o será, mesmo que seja apenas isso. Escrito, expressado, acaba de o ser. O momento é de escrever.

sábado, 7 de dezembro de 2013

A oeste, apenas mais uma rota

Versão Público - Fugas
http://fugas.publico.pt/DicasDosLeitores/328135_a-oeste-mais-uma-rota-de-peniche-ao-bombarral

Original

Manhã soalheira, ameaçada por nuvens carregadas, desencorajadas contudo, por uma temperatura amena de um profundo, embora pouco rigoroso, outono de início de novembro. Saída da orla de Peniche após um farto e típico pequeno-almoço de hotel, no quatro estrelas quanto baste, Atlântico Golfe Hotel. Situado num pequeno complexo turístico, o do Botado, com a atração internacional do golfe nas dunas, ao som do mar. A meio caminho entre uma breve viagem de carro à marginal de Peniche, uma incursão a pé pelas dunas até à praia, nesta altura deserta, da Consolação, ou um passeio à sua vila, também a pé ou de carro, consoante a preferência e disposição. Nesta pequena povoação, para consolo, a pastelaria padaria em que o nome diz tudo, Pão Quente, para um bom lanche, e o restaurante Cabem Todos, que embora não pareça, cabem mesmo, nem que seja preciso esperar. Em Peniche a oferta é basta e variada. A famosa Tasca do Joel que infortunadamente encontro quase sempre fechada nesta época do ano. Em alternativa, a escolha recai invariavelmente sobre aquele que é quase sempre a principal opção, desde a primeira caldeirada, o Rocha. No final da marginal antes da curva à direita para o forte, à primeira vista pouco apelativo, mas descontraído, aconchegante, de boa comida e carteira.

De volta à rota, o caminho segue pela nacional, fora dos rápidos itinerários principais (IP6) e autoestradas (A8), que o tempo é de passeio e admiração, destino ao Buddha Eden, Quinta dos Loridos, Bombarral. Pela nacional N241, não a principal, mas a secundária a N241-1, para maior ruralidade. Seguem-se quase duas dezenas de quilómetros pelo planalto das Cesaredas. Separação entre o pujante oceano e o sereno campo de cultivo. Dele se avistam ambos, num cenário de rara beleza. É ir devagar e espreitar à direita e à esquerda. As cores são do azul acinzentado do céu e do mar, ofuscado ao longe pelos raios de sol, do verde da vegetação baixa de breves canaviais, oliveiras e vinhas atarracadas, do castanho forte da terra esventrada por socalcos e carreiros de cultivo bem delineados e de dimensão média pequena. O ligeiro cheiro a estrume misturado e disfarçado pelo verde das couves e outras hortaliças, temperadas em crescimento pelo ar salgado e húmido da maresia. O dia é de descanso e passeio, não para quem trabalha e colhe ou lavra a terra com o trator. O branco de casas e moinhos, os antigos e os modernos de pás gigantes para aproveitamento da energia, a alternativa eólica.  

Gigantes no jardim dos budas, são algumas estátuas e estatuetas, de cimento bruto em formato oriental com pequenos e raros laivos de cor quente da terra. Conjunto de resultado estranho, num devaneio ou capricho milionário do comendador Berardo, louvado, apesar de tudo, pelo objetivo cultural do espaço. A extensão será a ideal, não justificando a opção do comboio, a não ser pelas crianças, sempre apreciadoras desta aventura. Longe de exuberante, visita bem justificada pela agradabilidade do espaço a céu aberto.

Aberto o apetite, como sempre se ouve dizer, pelos ares do campo, tempo então de almoçar. Logo ao lado, de carro, perto do Santuário Senhor Jesus do Carvalhal onde prevalece o sossego e pacatez, o Lagar. Restaurante pequeno, pitoresco e cuidado. Ementa nada exuberante, dentro do normal tradicional da cozinha portuguesa. Vai ser um polvo à lagareiro e um arroz de pato. Antes, para entrada, presunto e uma grossa fatia de queijo. De entre uma garrafeira publicitada como das maiores da península, não a de Peniche, a Ibérica mesmo, que vinho? Só um momento. Orientação preciosa e concisa do anfitrião. Da região, Dão ou Alentejo? Região. Aberto ou encorpado? Aberto. Sai, um Quinta de S. Francisco de Óbidos. Bem escorrega com a refeição! O polvo servido em pequenos pedaços tenros, numa travessa metálica com azeite quente e alho, rodeado por batatas a murro. Simples e muito bom. O arroz de pato, desfiado, tostado, com finas rodelas de morcela e outros enchidos num arroz árabe, colorido pelo amarelo do açafrão sarapintado de passas. Para sobremesa? Duas! Um gelado caseiro de três sabores num só, mas em camadas distintas, regado com chocolate quente, e, o especial do Lagar, uma generosa taça de doce de maçã reineta escondido pela cobertura de suspiro. De suspirar! Não se dava nada por ele, tal o aspeto discreto, mas revelou-se uma combinação perfeita para a sensação de final apoteótico. Último golo, que vinho deste não se desperdiça e café se faz favor.

De barriga e alma mais do que cheia, satisfeita, o regresso faz-se pela rota que mais convier ou apetecer, pelo caminho inverso de volta à praia ou ao hotel para um mergulho na piscina interior, para Óbidos e uma ginja ou mesmo para casa que Lisboa é logo ali. A oeste, apenas mais uma das muitas rotas deste pequeno, mas adorável país.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

O meu iphone caiu na canja

Embora assim possa parecer, isto não se trata de nenhuma rábula super engraçada, sobre a sociedade e o seu momento atual, metaforizada por um título… metafórico. Trata-se disso mesmo, o iphone mergulhou de cabeça na canja de galinha.

Pânico! E logo de cabeça, com o líquido a entrar pelos orifícios que controlam o som e o levam até aos auscultadores. O problema começa logo no líquido. Iphone não rima com canja. Nem com sopa. Com creme de marisco também não, mas com este o choque sociológico não é tão grande. O problema é que o iphone ficou preso no modo “auscultadores”. Mesmo sem eles. E agora?

Primeiro, rápida e desesperada limpeza com um pano, seguida da sugação do orifício, mas nada. O clássico DVL, desliga e volta a ligar. Minutos depois, aspiração, secagem com secador de cabelo e… nada! Nova sucção e pancaditas. Sem som para tudo, jogos, música, chamadas, vídeos. Só com auscultadores, sem eles, nada. Google! Que nunca será de fiar no que à Apple sugestiona. As sugestões são mais que muitas e tão parvas como as que tentara até ao momento: inserir e retirar o jack dos auscultadores umas 20 ou 30 vezes, com vídeo e tudo, em que só faltava a bolinha vermelha. Assim fiz. Nada. Colocar o iphone num saco de plástico e deixar no congelador durante 3 minutos. Sem medos! Pelo sim, pelo não, desliguei-o primeiro. Ainda fresquinho, nova aspiração. As aplicações continuaram lá todas, não foi nenhuma pelo cano e o modo auscultadores também não. Desisti. É esperar que passe, que era uma outra sugestão, antes da última e derradeira que seria ir à assistência aldrabar a garantia ou pagar um balúrdio.

Fui à minha vida. Passado algum tempo tive a necessidade de fazer uma chamada, liguei, falei, “então não íamos ver os porcos?”, ouvi “sim, parámos só nas bombas” e desliguei. No final pensei, olha, funcionou, ouvi tudo, está resolvido!

Portanto, a resolução para o problema, iphone preso no modo auscultadores, do inglês, “iphone stuck in headphones mode” é: utilizá-lo sem pensar na anomalia. Mas não se pode pensar mesmo, pois só assim funcionará! Isto vendo bem, podia ser convertido numa “ápe” ou “épe” conforme a pronúncia do inglês “app”. Qualquer coisa do género: “iphone mind reader for headphones mode stuck problem solve”. Só tem um inconveniente, o título é demasiado grande, mas podia ficar em iniciais: IMRFHMSPS. Muita forte!

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Maus alunos

Na universidade, tive um professor que chegava quase sempre atrasado, mas tinha a decência de ligar a pedir para esperarmos, que ele estava a caminho, de táxi. E nós esperávamos, pois apesar do caricato da situação, e de um estudante universitário ter muito mais para fazer do que estar à espera do professor, ele acabava por ser tido em consideração. Contou ele, numa das aulas, que existiam dois tipos de alunos que se podiam distinguir, no que à maneira de responder às questões e aos problemas dos exames, dizia respeito. Uns estavam no grupo da caça às perdizes os outros no grupo da caça aos tordos. A perdiz é um pássaro com uma trajetória de voo esquiva que requer estudo e grande esforço por parte do caçador que queira exercer o seu hobbie com sucesso. A caça ao tordo, por seu lado é o oposto, manda-se uma chumbada para ali, outra para acolá, que nalgum se há-de acertar! O problema é que se percebe claramente quando se tentam caçar perdizes, como se fossem tordos, às vezes acerta-se, mas a maior parte das vezes não.
E foi esta a imagem que tive quando foi anunciado o orçamento de estado para 2014…
Diz um ministro ao outro:
“Olha, olha, vai ali um carro a gasóleo!”
“PAAAMMM, PAAAMMM, PAAAMMM”
“Acertaste?”
“Não, só estilhacei uns vidros”
“Um funcionário!!”
“A donde?”
“Às tuas seis e um quarto!”
“E já saiu?”
“Hã?! À tua direita, porra!”
“RATATATATATATA”
“Um pensionista!”
“PAM!”
“Ainda mexe, pá”
“PAM! PAM!... PAM!
“Um contribuinte, um contribuinte!
“Mas contribui?”
“Deixa ver… 3+4 vezes 3,5%, raiz quadrada… naaaaaa”
“PAM!”
Para dizer a verdade, já não tenho a certeza de qual das caças se adequa ao quê, mas que andam a caçar com pescadores ou a pescar com caçadores, disso não parece haver grandes dúvidas.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

PAN


Praça da Alegria, contorna-se pela direita e antes do cruzamento do Hotel, fica do lado esquerdo. Eram as indicações que tínhamos. Lá fomos, às apalpadelas, pois só a poucos metros se percebe que é ali. Entrámos no Jardim dos Sentidos, mas não podemos ficar a apanhar ar por causa do PAN. O restaurante é simples, com a decoração cuidada e típica de apelo espiritual de um vegetariano que se preze. Paredes em cal tosca, levemente amarelada, divisórias com arcos largos em ruínas, reveladoras de tijolo maciço fino. Luz indireta nas paredes, vela na mesa e candeeiros pequenos de ferro velho no teto só para enfeitar. Ambiente calmo, acolhedor, sem constrangimentos, mas um pouco abafado, principalmente com a porta para o jardim fechada por causa do PAN.

Para abrir, uma caipirinha com personalidade própria: blocos de gelo bem formados, ao contrário do normal picado, rodelas generosas de lima, mergulhadas em bastante líquido doce e alcoólico, num copo entre o alto e o normal baixo da caipirinha. Para contrapor um chá de jasmin, quente sem açúcar, calmante para noites tranquilas, dizia. Para picar, cogumelos no forno, com recheio de espinafres e mozarela gratinada. E o primeiro PAN! De sabor, a fazer subir a expectativa para o restante.

Para comer, lasanha 4 queijos de vegetais e bife seitan com molho master chef de cogumelos. Só pelo nome, nada de mais. Primeira garfada e… PAN! Nova explosão. Alimentada por uma breve salada com um leve molho de iogurte e um borrão de puré de marmelo picante. PAN, PAN! Fecha-se a porta e começa o discurso de 12 minutos do PAN. Partido pelo Animal e pela Natureza, o Ratatoille aqui safava-se. Sem corrente de ar sobe a temperatura e, mais um golo. Assim vale a pena ouvir um discurso político, mesmo que sumido através da porta e com as palavras “sócio económica” pelo meio. VIVA O PAN! Viva! VIVA O PAN! Viva! VIVA O PAN! Viva! Em maiúsculas, que qualquer político que o seja tem que berrar pelo menos uma vez por discurso.

Para sair, sobre a mesa, crumble quente de maçã e ameixa com gelado de baunilha. PAN! Segue a conta que não foi nada de extraordinário para o espetáculo a que se assistiu. E toca a servir os convidados do PAN que eles ainda eram muitos. Mãe quero mama, diz uma criança na mesa ao lado. PAN sempre! A triplicar (ou mais): PAN, PAN, PAN!

domingo, 31 de março de 2013

Sempre

Tenho sono e durmo.
Acordo e adormeço.
Enfadonho o Dia. Os Dias.
Sonho acordado.
Sem dormir.
Penso, vivo fora de mim.
Escrevo.
Sonho.
 
Durmo.
Acordo.
Escrevo e não morro.
Amo sempre.
 
Viajo.
Corro.
Choro.
Rio.
Durmo.
 
Sonho.
Acordo.
Vivo.
Amo sempre.
 
Invento.
Crio.
Dou e recebo.
Tiro e sofro.
Durmo e acordo.
Sonho todos os dias.
Sobrevivo, vivo.
Não morro.
 
Amo sempre.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

A 3.ª Cidade

no Record...

Paços de Ferreira a capital do móvel, é por estes dias a 3.ª cidade do país. Lisboa e Porto as primeiras. Uma, a capital do imóvel, a outra, a capital da fruta. Lisboa faz jus ao epíteto com tanto e bom edifício para empregar e habitar uma quarta parte de Portugal. Vale que os níveis de cimento regressaram aos tempos poupadinhos de antes do 25 de Abril, mas não a tempo de evitar muita tonelada de paredes sem alma por falta de ocupação. A fruta do Porto é da boa e rende bons juros, “vocês sabem do que eu estou a falar”. Mas nem só dela vivem as suas gentes, o seu espírito, são o sumo, a sua vida.

Em Paços de Ferreira, a estrela do futebol chama-se Vitor. Sim, Vitor. Só Vitor. Se fosse nas capitais maiores, o Vitor era outro. Não o mais conhecido. Seria o Vitor da Silva, Emanuel ou Emanuel Cruz. Algo mais comercial e dado exposições mediáticas. Talvez por isso não tenha vindo para Lisboa. Ou para um bairro de Lisboa, como diriam os da fruta. É como o Joãozinho de Aveiro que andou uns 15 dias a pensar no nome que deveria ter na sua nova camisola verde e branca. João, João Carlos, João Graça. Acabou por manter o Joãozinho e no 2.º jogo fez uma gracinha, marcou um autogolo com as costas, a preocupação com o nome era justificada, quem sabe se com outras letras a bola não batia de forma diferente e não seguia para fora, em vez de para a baliza do Patrício (este nome é dos que não engana, está destinado).

Joga lá também o Caetano. Este já usa só o sobrenome, tem a carreira pensada para altos voos. Se fosse pelo nome próprio era apenas o Rui. Rui há muitos e o maestro ainda é o Costa. Este será mais um Barros. Meia leca, jovem, português e vice-campeão do mundo. Teve nos pés a bola que o podia ter feito campeão em vez de vice. Apesar disso, de todos os vices, será o único que não caiu no esquecimento, como caíram os outros que se estabeleceram em cidades melhores, maiores e com mais oportunidades. Mais competitivas, concorrentes, injustas e viradas para os jovens. Estrangeiros. Brasileiros, hispânicos sul-americanos, africanos ou europeus. Que não lusos.

O treinador é o Paulo. Fonseca. O estádio, o da Mata Real, que não será maior que o do Cova da Piedade. Pequeno e nada dado a megalomanias cimenteiras das capitais. Quem por lá passar até poderá ver as camisolas amarelas a secar nas cordas presas, quem sabe, em móveis em fim de carreira. Pode até já nem ser assim, mas pouco tempo terá passado em que o era. Dificilmente chegarão a jogar nos grandes estádios da Europa. É melhor assim.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Erro Informático!


O famoso inseto traduzido do inglês, portador de um qualquer vírus que não o dengue, mas nos parece ameaçar muito mais do que ele. É a causa de todo o mal. Ou grande parte. Um livro para adultos no plano nacional de leitura das crianças, serviços que não funcionam ou mal, por causa do “sistema” ou da rede que “hoje não dá nada”, um Orçamento de Estado para 2013, com medidas violentas também para os sistemas que e o implementam e correm o sério risco de o fazer mal. E sempre o mesmo, o erro informático!

São bites e bytes a circular pelo cabo, pela fibra, pelas frequências que atravessam tudo, incluindo nós, deixam-nos o mundo à distância de um clique, e a miragem da velocidade da luz transformada em realidade. Virtual. Uma revolução. Depois da industrial, a digital. Na industrial, a produção em massa com mais e melhores meios, o capital, o início da globalização, mas ainda um ritmo acompanhável. Antes da industrial, muito antes, a agrícola. Também ela radical. Trouxe alimentos, autossuficiência e uma vida nova, mas ainda saudável. Agora, a revolução da informação digital global. A tecnologia de ponta capaz de possibilitar o impossível. Se não tiver erro. Se não for um erro. O que ontem era de ponta, hoje já não é. Evolui muito rápido. Muito mais do que o ser humano consegue seguir e quando assim é quem perde é o ser. A sua capacidade de adaptação, a do humano, é distintiva entre os seres, mas nada de abusos. Diz a medicina que uma das doenças mais difícil de combater, o cancro, resulta desse abuso, das grandes, repentinas e não acompanháveis alterações do meio envolvente. No digital o ritmo é de top, alto débito de informação, exige esforço com reação imediata e constante. Absorve-nos, puxa-nos, deixa-nos corcovados, rebaixados perante o aparelho. Em vez de nos elevarmos, ficamos mais baixos. Sendo a altura média, um indicador de saúde e bem-estar, o pronuncio não pode ser bom, embora pareça, a exigência sempre foi, boa. A tecnologia é boa, o facebook até ajuda a curar depressões. Tem lógica, insere-nos socialmente, embora que de forma virtual. Aproxima-nos, mas tira-nos algum tato. Parece lógico um jornal despedir para se dedicar à versão online, mandam as audiências e as tiragens. Lógico, mas com erro estratégico. Já temos carros que andam sozinhos, mas estudos revelam que estamos menos inteligentes. Nós menos, as máquinas mais, triunfa a inteligência artificial. Deixamos de ser reais. O erro informático, é humano. Se o eliminarmos, corremos sérios riscos.

domingo, 23 de dezembro de 2012

O Ingrediente Desenrasca

Uma cebola e meia e dois dentes de alho picados em azeite para o refogado. Um lata de tomate pelado despejada. Sal, meio caldo de Knorr, tudo mexido e deixado a cozinhar. À falta de peixe fresco, que seria sem dúvida melhor, banham-se em água quente, 4, 5 ou 6 (depende da clientela) lombos de pescada congelados da pescanova, antes de seguirem para o tacho e para que não o façam em pedra. Sal, pimenta e, não havendo pimento, pimentão-doce a colorir cada um deles. Sem louro para aromatizar, salsa picada da margão dispersa. Tampa durante uns minutos. Envolve-se tudo e rega-se com quase um pacote pequeno de vinho branco e dois ou três copos de água, mais uma pitada de sal e tampa novamente para mais uns bons minutos. Lombos partidos com a colher de pau. Camarões congelados em fim de embalagem juntos ao cozinhado e mais água, para um abundante caldo. Alguma fervura depois, a massa cotovelo, já cozida e perdida em basta sobra no frigorífico. Nova e breve fervura. Em cru, mais demorada, mas sem deixar empapar. No final exigem-se coentros a cobrir, na sua ausência umas folhas de salsa com frescura de meia dúzia de dias.

Não tenho nada contra o Ingrediente Secreto e até sou fã, mas se há coisa que chateia em programas de culinária, é ser necessário ter um supermercado em casa para desenrascar um bom prato. Esta massada, a minha, a nossa, de peixe, não será um manjar de requintado sabor, mas estará bem longe de uma refeição frete. Para mim, servida bem quente num prato de sopa, com bastante caldo, pão ou tostas a acompanhar. O piri piri, só no prato por causa dos putos. Também para eles, podem-se juntar umas delícias do mar já perto do final da última fervura. Para beber pedia-se um verde, mas, mais uma vez, apenas havia um resto de meia de Monte Velho tinto. Este prato poderá também pedir verão, mas quem se chateará num Natal primaveril como este?


E por falar em peixe, dias antes, em noite menos amena, de alguma chuva, com o tal ingrediente secreto que não descobri, um excelente arroz de garoupa na Tasquinha do Lagarto em Campolide. Bem fácil de encontrar foi o picante bomba, doseado à gota e ao gosto e coragem de cada um. Para apagar o fogo, um bom verde da casa, condizente com a decoração maioritariamente leonina. O Benfica até foi perdendo na TV em Olhão, mas virou já no final, ficando o consolo para a Tasquinha esgotada, de tão boa iguaria servir, nesta historicamente definhada época do lagarto.

domingo, 9 de dezembro de 2012

Braziu

Há 7 anos, também em novembro, mas com muito mais calor do que em Paris, foi assim:
Faz hoje 8 dias estava eu numa praia distante, ao sol, a secar a água salgada no corpo e a observar a arte do voo de um passarão que pesca no mar, mergulhando literalmente após uma descida a pique. No dia anterior, à tarde, o mergulho foi diferente. Um baptismo na Ilha Rata, uma das secundárias. Não houve descida a pique, apenas cerca de 10 metros abaixo da linha de água e uma grande subida no nervoso miudinho. A confusão das bolhas de ar que saem, ao se expirar pelo bocal por onde se respira, e parece que nos vão arrancar a máscara da cara, logo se esquece mal começamos a conviver naquele ambiente submerso. 30 minutos foi pouco, mas deu para ver uma moreia bem grande, uma raia-manta de meter respeito, de tal forma que me imobilizou completamente quando passou poucos centímetros abaixo de mim, um cardume enorme no qual me deu vontade de entrar. Mais uma série de outros peixes das mais variadas cores e tamanhos. Um dos quais defecou duas vezes à minha frente. Faltou o tão desejado tubarão. De manhã, outra sensação de voo. A cerca de 100 metros da Praia do Porto, após alguns minutos de snorkeling, eis que surge no campo de visão, uns bons 8 metros na vertical um navio grego naufragado! Mais peixes por entre destroços e apenas o som da respiração pelos poucos centímetros do tubo que nos ligam ao ar. Depois o regresso de novo à areia após alguns minutos a dar às barbatanas sempre com os olhos à procura de algo que mexa. Tempo para descansar as pernas do cansaço acumulado e sentir uma chuva passageira. Tão passageira que mal acabou já estava tudo seco, outra vez. O cansaço a sério começou na tarde do dia anterior, na Praia do Sueste. Toca a meter o equipamento, máscara, tubo, barbatanas e pernas. Segundo o guia, também equipado, "nadamos 300 metros na direcção daquele areal e pode ser que se veja alguma tartaruga". Mal meto a cabeça na água, uma raia, esta mais pequena. E lá seguimos a nadar, com excepção para o "nipó-brazuca", que apesar ser mergulhador credenciado seguiu sempre em pé e de costas, arrastando as barbatanas pelo fundo coberto de vegetação. Alguns minutos depois com o tal banco de areia ainda distante e o cansaço já a pesar, eis que: "por aqui, está aqui uma". Uma tartaruga, com cerca de 70 centímetros de comprimento a nadar a outros tantos de distância de nós. De parar a respiração. O acompanhamento e aproximação era fácil de manter, quase até ao toque, tanto que não resisti e toquei ao de leve na carapaça. Consegui-me esquivar à reacção de defesa, do ataque com a boca em forma de bico. Lição percebida. Entretanto, muitas outras se cruzaram no caminho, e o frenesim continuou sem a preocupação do cansaço, apenas no contemplar e na tentativa de capturar uma boa foto. Uma hora ou duas, e muitos metros depois, o regresso ao ponto de partida, quase sem pernas, já sentado à beira mar no balanço da pouca ondulação, de novo com a chuva, mas com a certeza de uma experiência única, claramente superior às expectativas. O melhor fim para o primeiro dia a sério. Um dia que se iniciou de buggy com o guia a começar pela Praia do Sancho, vista a 50 metros de altura, com acesso por mar, ou por escadas entre fendas na falésia. O nosso. E aqui a primeira experiência de snorkeling, algo atabalhoada pela habituação à respiração pela boca. Pequeno pormenor de imediato esquecido, mal se atravessam no nosso nariz os primeiros peixes. Curiosos e sem medo. A atrapalhação inicial dá lugar a muitos minutos de observação. A temperatura da água assim o permite. De seguida a Baía dos Porcos, muito pequena e de difícil acesso, a pé por entre as rochas nitidamente de origem vulcânica. Algumas pareciam acabadas de solidificar. Grandes gotas de uma massa espessa, que por ali escorreu. Depois do almoço, a Praia do Leão, também vista de longe, pois quase todas as praias têm o acesso por trilhas. Naquele dia apenas dois cavalos procuravam o banho. Uma praia interdita durante os meses de desova das tartarugas (Dezembro a Junho). As mesmas que quando crescem vão vivendo na praia ao lado, a do Sueste. A tal onde o dia culminou em grande. O mesmo não se pode dizer do início do dia anterior, o primeiro na ilha. Aterramos cedo, 9 da manhã após uma hora de voo de Natal. A volta aérea antes da aterragem prometia para os 3 dias seguintes. Infelizmente tal não se verificou, nesse dia. A Tati adoeceu. Acordamos em Pipa eram 3.30 da manhã, e o corpo ressentiu-se. Depois o impacto das condições menos confortáveis de um ambiente mais seco e rudimentar. Acabou de passar a época das chuvas e não choveu, e o que se segue é a época da seca. O único açude de água doce está seco e todo o abastecimento é feito através da dessalinização da água do mar. À noite, após a recuperação da Tati, lá fomos à palestra conhecer mais da ilha Fernando de Noronha. A 300 Km de Natal, pertence ao estado de Pernambuco, dois ou 3 estados mais abaixo longitudinalmente. Politiquices. Descoberta por Américo Vespúcio em 1503, numa expedição financiada por Fernão de Noronha. Nunca lá pôs os pés. Actualmente são 26 km quadrados, com uma estrada principal alcatroada de 7 Km. Construção à beira-mar ou relativamente perto, nem pensar, e a protecção ambiental é lei. Nesse aspecto os brasileiros são bem mais evoluídos. Matar tartarugas é crime, punível por lei e sem caução. Não só na ilha como em todo o Brasil. 30 reais por noite é a taxa de preservação ambiental na ilha. O número de turistas é limitado, até porque apenas há um hotel e algumas pousadas de luxo com diárias com preços proibidos. Muitas pousadas familiares, com preços mais acessíveis mas apenas meia dúzia de quartos cada. Foram 4 dias muito bons. Antes, uma semana, mais turística em Pipa a cerca de 80 Km de Natal, a capital do estado do Rio Grande do Norte. Um hotel (Ponta do Madeiro) muito bom, numa falésia, com acesso à praia por 196 degraus. Uma das mais belas que já vi. Quase deserta e selvagem, finalizada numa baía, com os golfinhos que lhe dão o nome, devido às visitas diárias para uma refeição. Destaco o passeio de buggy à beira mar, até às dunas móveis em Natal. Ontem peguei no livro do Miguel Sousa Tavares, "Sul - Viagens" e por não saber onde tinha ficado a leitura, abro por acaso no capítulo "Nordeste - essa praia não tem fim". O gajo (para não lhe chamar outra coisa, tal é a inveja) fez uma viagem de buggy de Natal a Fortaleza, durante 1000 Km, com 90% de praia. E tal como ele acaba esse capítulo, também eu várias vezes pensei, o que teriam pensado os portugueses quando desembarcaram pela primeira vez nas praias do Brasil. E como disse o "bugueiro": "Êta, Braziu grande como à porra".

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Paris em 2 dias (3 de 3)

Em jeito de itinerário turístico e porque me deram bastante jeito as sugestões cibernéticas, aqui ficam as minhas impressões do nosso percurso em Paris. Quem sabe se também não serão uma ajuda para alguém.

Dia 0. Ficamos na zona Staint-Michel-Notre Dame, Saint Severin num hotel com o mesmo nome. Recomendo. A chegada de comboio subterrâneo leva-nos para uma emersão abrupta no meio de um cartão de visita: Catedral Notre Dame. Por muito que se tenha evoluído, e existam vistas de rua no Google, nada se compara ao estar lá e ter o sentido de estar perdido com um ligeiro atordoamento de toda a envolvente, os edifícios históricos, o rio, a ponte, a ilha. Depois de largadas as malas e como o sol desaparecia rapidamente, de novo para o comboio com destino ao ícone maior: Torre Eiffel. A primeiríssima impressão até nem foi assim tão impressionante, mas com a aproximação, o céu num límpido azulão de início de noite, a torre iluminada de amarelo e crescente a cada passo, as toneladas de ferro parecem ter íman. Não se desvia o olhar e só paramos quando ela nos cobre. Um crepe com chocolate e outro com mel para aquecer. O rio sempre presente. As filas intermináveis levam-nos a atravessar a ponte e subir ao Trocadero e de novo a torre, no centro, avistada de local com engenho milimétrico para nos ombrearmos e iludir com a possibilidade de a agarrar com a própria mão. Já de regresso ao Quarter Latin para jantar num dos muitos restaurantes das movimentadas ruelas desta zona. Sopa de cebola em todos os menus. Não fiquei fã, ao contrário da Tatiana.

Dia 1. Depois da entrada rápida no interior da catedral do corcunda, segue-se o Hotel de Ville. Imponente, telhados íngremes, escuros, caraterísticos, numa praça larga apenas agitada pelo som da brisa forte nas árvores. Manhã cedo. Fria, cinzenta, céu baixo e carregado, gotas de chuva aqui e ali, algumas rajadas que desarranjam o cabelo, ruas sossegadas e apenas ocupadas pelo tempo desconfortante. Pouco convidativo mas, para mim, o ideal para a viagem à época sombria e inóspita da Idade Média. Seguimos para Este pelas ruas do bairro Marais até Place des Vosges. Apanhamos o metro para poupar as pernas, pois o dia é longo, e invertemos o sentido rumo ao Louvre.

A saída da estação leva-nos para a fila da entrada. Perto de uma hora para o conseguir, com compra do bilhete incluída. Podia ser pior. Mapa, orientação e resistência para explorar os 3 pisos de museu. Estátuas, estatuetas, espadas, joias, jarras, tapetes, carpetes, utensílios, quadros e mais quadros de toda a parte numa vasta coleção. Até ao quadro dos quadros: Mona Lisa. Ir a Paris tem que significar obrigatoriamente visitar o Louvre. Dá para meio dia, nós despendemos perto de 3 horas, porque o corpo já reclamava, o sol chamava lá fora e o almoço também.

No Jardim dos Tuileries, curta paragem para descansar, aquecer o estômago com baguetes e croissants do Paul, que está em todo o lado, o rosto com o sol intimidado por nuvens teimosas e a alma com um café expresso de 2 euros por ser de levar, para ficar seria mais 1. Continuando para Oeste, o jardim termina na Praça da Concórdia, larga, agitada pelo trânsito em redor do obelisco e de duas fontes, à esquerda uma das inúmeras pontes de curta distância sobre o Sena, esta também da Concórdia, bem larga, com vista para mais um palácio.

Segue-se, uma das avenidas mais famosas do planeta: Campos Elísios. Umas primeiras centenas de metros verdes que antecedem a azáfama. O sol segue baixo e demorado no horizonte, talvez um dos motivos para a multidão que se passeia por esta zona da avenida, autêntico centro comercial a céu aberto, onde se torna difícil progredir. Termina-se em mais um marco: Arco do Triunfo. Nova paragem, desta feita deitados mesmo numa das laterais do arco, motivos: descanso e sol. No seguimento da avenida ainda avistamos La Defense, mas cortamos pela Kléber em mais uma caminhada até ao Trocadero e, de novo, a torre. Fotos e mais fotos, vários casamentos com noivas arreganhadas, um grupo de dança de rua com boa mexida dance dos anos 80. Mais uns crepes para recarregar  baterias e corda aos sapatos pela margem direita do rio até Pont D’Alma. Bateaux Mouches e cruzeiro noturno a descoberto, mas com fatiota à pescador do Mar do Norte, pelo Sena com os vários monumentos iluminados. Outro programa obrigatório.

Dia 2. Manhã mais cinzenta e chuva um pouco mais persistente. Pequena incursão a pé para Sul. Domingo no seu início como tantos outros, calmo e com pouca gente. Panteão, universidade Soborne, Jardim Luxemburgo pouco povoado, um grupo de turistas, atletas matinais e dezenas de cadeiras de ferro, verdes, vazias para dias de relaxe ao sol. Metro, que o dia anterior fez mossa. Para Norte, chegada a Montmart para a visita a mais um ponto a não perder: Basílica Sacré Couer e bairro envolvente. Escadaria, numa encosta elevada que permite uma visão sobre boa parte da cidade. Aqui teria preferido o sol em vez do frio, chuviscos e vento cortante. No interior da basílica bem mais aconchegante, decorre a missa dominical, o que não impede os turistas de circundarem todo o recinto, dentro do silêncio possível. Nova oportunidade para descansar enquanto decorre a homilia. Place du Tertre, pequeno largo onde se pinta tudo e mais alguma coisa, apesar da humidade.  
Continuação pelo bairro e uma das ruas mais famosas, Lepic, morada do café da Amélie, que não visitamos. Avistamos sim o Moulin de la Galette, antes da ponta final da rua. Aqui já se sente a vivência de um bairro típico, com todo o comércio e agitação das compras matinais de domingo, pão, fruta, legumes, chocolates, bolos, em pequenas mas cuidadas lojas de rua, e de novo o Paul, mais baguetes e croissants. A rua termina no Moulin Rouge, e na avenida do red district de Paris, Boulevard de Clichy. Depois de breve paragem, longa e nada rentável caminhada para Sul. Já com sol aberto passamos pelas galerias La Fayete fechadas por ser domingo. Ópera e paragem para cappuccino e chá quente. Nova praça, Vendome, rodeada pela alta costura. Ironicamente damos por falta do impermeável da Tatiana. Nova igreja, em forma de templo clássico grego, Madeleine, com pequena escadaria a partir da qual se percorre sem andar, apenas com olhar frontal, a Concórdia, obelisco, ponte, palácio Bourbon e cúpula dos Invalides.
Para onde seguimos, mas apenas avistamos da Ponte Alexandre III. Já sem grandes planos, desperdiçamos a oportunidade que o primeiro domingo do mês oferece para visita gratuita aos museus d’Orsay e Rodin. As pernas não ajudaram à decisão. Entramos no metro, duas mudanças de linha, percursos labirínticos nos túneis das estações e ligações. Sem grande beleza não deixam de ser interessantes pelo emaranhado e longevidade aparente, talvez o mais parecido com os tuneis dos esgotos, também visitáveis. Alguns minutos depois, poucos para a distância, estamos na ponta Este da cidade já bem fora do centro, e saímos com entrada direta para o cemitério Pére Lachaise. Imensidão fúnebre de última residência de várias celebridades, com direito a mapa e tudo. Fomos em busca do mais famoso com a campa mais discreta e escondida: Jim Morrison. Local também onde alguns, visitantes, desfrutam do pôr-do-sol. Regresso ao hotel e tempo para mais um crepe. Pequeno passeio à noite pela zona Saint-Michel.

Mais Meio dia. Última manhã, com nuvens sem chuva, mas mais frio. Passeio calmo pelas redondezas em dia de fecho de museus, descoberto da pior forma: nariz na porta do Carnavalet. Regresso pela ilha Saint-Louis, residência de privilegiados e pouco mais, no passar do tempo para a despedida, na submersão para o comboio de regresso. Não teremos visto tudo, o que não passará de mera desculpa para um regresso certo. 

domingo, 25 de novembro de 2012

Musée d’Or (2 de 3)

Fiz como o Sócrates, pirei-me e fui desanuviar. Está visto que fui a Paris. E resulta, em poucos minutos e durante alguns dias esquece-se por completo tudo o resto. A cidade faz jus à fama e somos completamente absorvidos por ela. Dá vontade de andar todos aqueles quilómetros para trás e para frente, rio acima, rio abaixo e simplesmente apreciar. A cada rua, caminho, esquina, paisagem, brota cultura, misticismo, história e arte. Um património de valor incalculável, percebe-se estimado e rentabilizado pelos franceses. Milhões e milhões de turistas e euros a circular. Ininterruptamente. A vaidade e exuberância francesa de outros tempos foi preservada, até um paralelepípedo chamado de obelisco que roubaram aos egípcios lá está, em substituição da guilhotina, erguido na praça que ironicamente se chama de concórdia. A própria guilhotina para lá deve estar, eu não a cheguei a ver. Vi muitas outras coisas e dei comigo a pensar, e nós? Com séculos e séculos de história com o mais variado recheio, não teríamos o suficiente para fazer o equivalente a centros comerciais de museus? Espera, isso já temos. Não teríamos o suficiente para fazer estádios de museus? Isso também. Não teríamos o suficiente para fazer autoestradas de museus? Outra. Aproveitando a deixa do Miguel Sousa Tavares, não teríamos o suficiente para fazer Alquevas de museus? A quantidade de quitangas que os nossos descobridores arrecadaram (roubar era para outros), daria certamente para algo mais do que apenas especiarias. Não que despreze as especiarias, têm a sua função, mas para o turismo, não será fácil convencer um turista, dizendo-lhe que há por cá bom petisco.

É certo que temos outros atrativos de grande valor e características únicas, mas quanto a museus, Portugal, estando longe de ser um zero, podia ser muito mais. Teremos passado suficiente para vários Louvres. Segundo se diz, desbaratamos quase tudo em ouro. Temos das maiores reservas de ouro do Mundo, pelo menos relativamente ao nosso tamanho. Em termos absolutos somos 14º. Em termos práticos pouco vale, apenas chega a cerca de um terço da ajuda total do resgate atual do FMI. Então, se não temos total liberdade para o vender, nem isso adiantaria grande coisa, sugiro que se crie o museu do ouro. Sempre tive curiosidade em saber se ele existe mesmo em forma de barras, ou como uma qualquer gruta pirata, num mar de joias. Seria algo grandioso, imagine-se uma sala longa e no centro, protegidas por uma redoma de vidro à prova de roubo, toneladas de ouro em barras ou joias, todas amontoadas e acessíveis, à vista, dos visitantes. Para mim seria brilhante! E para completar o quadro, num dos topos, qual guardiã, o retrato pintado da Merkel em pose Mona Lisa.

sábado, 24 de novembro de 2012

Gioconda (1 de 3)

Nunca vi tamanha adoração por uma senhora. Pintada. Vêm de todo o lado só para a ver e fotografar. Pintada num quadro. Enclausurada numa redoma de vidro para não se estragar nem ser importunar com o ambiente à sua volta. Impávida e serena como se nada fosse. Os peregrinos amontoam-se, esticam-se, com olhares e objetivas apontadas. A agitação é tanta que a apreciação dispersa-se nela própria, em vez de na obra. De refinada arte, dizem!


Acabei por não a analisar convenientemente, nem terei conhecimento suficiente para o fazer. Despreocupada e desinteressadamente, poderá parecer nada de mais, mas a senhora tem mais de 500 anos! Mal ela imaginaria que ficaria famosa ao ponto de vir gente de todo o mundo para a admirar, depois de séculos de tropelias, onde se contam raptos, mudanças de residência e tentativas de agressão. Sinceramente, como mulher não é nenhuma obra de arte, um rosto que não sendo feio, não é nada bonito, um decote bastante discreto, roliça e de felicidade contida. Ao vivo passou-me ao lado, apesar de a ter tido meia dúzia de metros à frente. Agora percebo que a devia ter visitado mal entrei em sua casa, o desgaste e saturação das pernas e cabeça, provocado pelos inúmeros focos de interesse das várias salas, pisos e recantos do seu museu, espaços esses onde, em contraste reina a calmaria, superiorizou-se à azáfama da multidão de cabeças e corpos concorrentes ao avistamento.

Especial será sem dúvida o facto de ter sido criada numa época longínqua, comprovando que o génio, não depende do tempo. Sem certezas do que digo, é bem possível que tenha revolucionado o conceito de retrato. Mas mais do que a técnica empreendida, o fenómeno será tudo o que até agora movimentou e continuará a movimentar à sua volta.

PS: bem que um artista português qualquer, ou um de renome como a Paula Rego, podia ter aproveitado a visita da senhora Merkel a Portugal para lhe pintar um retrato, nada garante que daqui a uns séculos não viesse a ser a Mona Lisa II, exposta num museu qualquer português.

domingo, 18 de novembro de 2012

Like Music

Existe por aí um fornecedor de TV que eu agora não posso dizer o nome (ou não me apetece), mas adianto que começa por “M”, acaba em “O” e no meio tem a letra “E”, que mesmo sem ter a concessão de serviço público, já o exerce. Isto de o serviço público cair na mão de privados ser um perigo, devido ao risco de tal serviço não se efetivar, ou não ser suficientemente bom, é uma grande balela. O serviço público é tão bom quanto for o produto que se promove e a forma como a promoção é feita. O “marca do fornecedor” Like Music é disto um grande exemplo.

A música, como em qualquer cultura, é um elemento fulcral que deve ser preservado, divulgado e fomentado por um digno serviço público de televisão. É isto exatamente que o Like Music faz. E muito bem. O produto, a música portuguesa, é excelente, a promoção inovadora, original e eficaz, e o serviço público resulta em excelência. A ideia é simples, e como em muitas coisas é das ideias simples que nascem grandes invenções. Uma banda ou um artista a solo, em ascensão ou de créditos firmados, um concerto ao vivo, mas sem público. Aplausos, isqueiros, saltos e pedidos de encore, mas sem público ao vivo. Público confortavelmente instalado em casa, na sala, cozinha, quarto, sofá ou cama, sozinho ou acompanhado, comando sempre na mão, mas sem música ao vivo. TV, box ou computador, fibra ótica pelo meio e está o espetáculo montado. A música começa, o público vê, ouve e sente, aplaude, salta, dá à chama e pede mais, pelo comando ou rato, os artistas sentem e puxam pela contabilização das reações, leem e respondem, ao vivo, aos comentários do facebook. Numa pequena sala de concertos, a plateia é o mundo de interação virtual.

Nunca será este um concerto ao vivo em toda a sua plenitude, mas a vibração está lá. Que o digam Blasted Mechanism, os últimos que por lá passaram, terminaram extasiados após louca atuação e maratona de incentivo ao record dos 800 mil aplausos. Antes deles David Fonseca, Filipe Pinto, Wraygunn, Jorge Palma, Nu Soul Family, Amor Electro, entre outros. Vale a pena entrar, à boa maneira portuguesa, é de borla e basta clicar. No próximo dia 26, Aurea, valerá a pena ver. E ouvir também.

sábado, 6 de outubro de 2012

Palavras para quê? (parte 2)

Não resisti e tive que escrever umas palavras. A imagem é a caricatura perfeita de um país que se encontra na situação que se conhece, comemora a implantação da república, longe do povo, num feriado com extinção prometida. Pela situação que se conhece. A Bandeira não foi hasteada simplesmente ao contrário. Militarmente quereria dizer que o inimigo estaria próximo e estavamos em perigo, mas não estamos em cenário de guerra, militar, apesar de até essa já ter sido uma hipótese mais remota. A bandeira está sim, invertida. Pelo menos foi isso que tive que fazer no  Microsoft Picture Manager para obter um resultado igual ao do Cavaco e do António Costa. Somos portanto, uma nação invertida, e apesar do colorido da bandeira, não estaremos a querer mostrar ao mundo que somos todos orgulhosamente gays. Como sugere o dicionário para invertido. Que a coligação é farinha do mesmo saco, ou socialistas e sociais democratas jogam na mesma equipa. Deixámos foi de estar habituados aos mesmos usos e costumes. Língua ainda temos, mas cada vez menos nos entendemos ou somos entendidos. Governados por leis próprias e soberania também já era. Começo a ter dúvidas que tenha sido apenas um ingénuo erro protocolar, tal é o enquadramento cénico.