quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Pires de caracóis

Nota: Expresso Curto é a newsletter diário do Expresso, vale a pena.
 
Começo o meu expresso curto com um pires de caracóis, que é como quem diz, meia dose. Para não demorar muito. Expressos, cafés ou bicas, curtas, italianas, cheias, pingadas ou com cheirinho, tirei muitas na adolescência. No café, snack-bar, cervejaria, pastelaria, restaurante, o estabelecimento familiar tudo em um, tão em voga nos loucos anos 80 e 90. Tudo era lucro porque trabalhar, mais do que sol a sol e ter que dar ao fisco era um absurdo. Conheço bem, compreendia e aceitava as motivações da economia paralela. Percebo agora melhor ainda, a importância da fatura com NIF.
 
A SIC fez ontem as contas. Para a liquidação do IRS de 2015, em 2016, conta tudo, dentro dos respetivos limites, desde que com fatura e NIF. Nada mais lógico e natural. Assim os contribuintes vão fazendo o controlo no site das Finanças, e a famosa máquina fiscal consiga ter tudo integrado. Para todos, e que principalmente os grandes grupos económicos não fiquem de fora, ou será que, por exemplo, sistemas de faturação como o do Continente (em tempos?) isento de certificação fiscal por decreto-lei á medida, continuarão a vigorar?

Importa saber de onde vem e de quem é o dinheiro. De Sócrates ou do amigo Silva? A defesa defendeu-se, mas continuam as dúvidas.

Dúvidas, dívidas e caracóis novamente da inevitável Grécia. 10 ministros novos. O já destacado ministro das finanças grego Varoufakis. Antigo professor e também aluno. Terá sido bom ou mau aluno? Terá feito o exame de professor com erros ortográficos? E erros de matemática? Terão sido feitas as contas aos 28% de aumento do salário mínimo grego? 171 euros a juntar aos 580! Arrisco dizer, sem ser economista nem financeiro, que serão centenas (milhares?) de milhões de euros entre o deve e o haver, no que tem que se pagar a mais, no que se tem que isentar, ou nos subsídios que têm que se atribuir. Não é uma bazuca, mas não deixar de ser um belo obus. Um abuso. Se dúvidas ainda há do que este Syriza poderá vir a fazer, pela amostra, promete.
 
Em sentido inverso, os bancos gregos cotaram menos 25%. A troika e os mercados enervaram-se. Talvez seja melhor um calmante. Para os portugueses, atenção aos genéricos. Afinal parece que alguns são também eles duvidosos.

O melhor será tomar o expresso com uma 1000, 9 e 20, uma CR&F, aldeia velha ou S. Domingos. Vodka nem por isso. Imagens ontem da humilhação russa aos prisioneiros de guerra ucranianos. 70 anos depois do horror máximo inimaginável, os exemplos continuam, sejam eles americanos, muçulmanos ou africanos. Continuamos uma espécie reles incapaz de evoluir. A Europa e o Mundo mais do que velhos, estão decrépitos. Talvez por isso se tentem descobrir, novos mundos, sois e sistemas solares. Os portugueses lá fora descobriram 5 novos planetas. Pelos vistos, tão velhos como o big bang.

Big bang, big ben. Tudo gira à volta do tic, tac. A passada, o binário digital, o batimento cardíaco, o motor, o amor, o sexo. 50 sombras de Grey de qualidade duvidosa, em estreia no cinema, o dia dos namorados, o salão erótico de Lisboa e o carnaval, tudo no mesmo fim de semana, no fevereiro que aí vem. Vai ser o forrobodó! É esperar para ver, por certo o próximo mês não ficará atrás deste marcante janeiro.

O que eu ando a ler:

Sherlock Holmes. Para desanuviar e entreter. A astúcia, capacidade de observação, destreza de raciocínio, inteligência e fantasia que tão bem podem ser aplicadas, com o devido desconto, na vida do dia-a-dia.

Não estou ainda a ler, mas vi ontem na montra da livraria Apolo 70, a história do Endurance - Encurralados no gelo. A comprar.

Há também quem leia lábios. Mas isso fica para mais adiante.

Frases:

"Nunca mais faças isso dentro da área c..., tu vai para ... pá!". A culpa nem é do Eliseu, que tem feito jus ao seu nome de avenida francesa, tal é a facilidade com que os adversários desestabilizam o Benfica pela sua ala. A culpa é de quem tira um André Almeida, na melhor fase da época do Benfica. 700 e muitos minutos sem sofrer golos, mas o miúdo, que até também é dos preferidos do Jesus, desde os tempos do Belenenses, teve que sair para entrar a primeira escolha do treinador.

"Na Taça da Liga, só com juniores". Talvez por isso, tenham deixado a decisão do apuramento para as meias-finais com o Benfica, na mão de terceiros, neste caso o Belenenses e o Vitória de Setúbal, curiosamente os últimos a não perder com o leão.

Por falar no leão, Figo na FIFA, tem musicalidade...

sábado, 24 de janeiro de 2015

Maus alunos II - O regresso do bife.

- Pedro e Paulo, estão aí?
- Mário, és tu?
- Saiam de trás da moita, tenho aqui uma arma nova!
- Estava a ver que não! Isto de caçar, contribuintes, pensionistas e carroças velhas, com pouco mais do que fisgas… é duro, já não tem piada.
- Uma bazuca!
- Boa Mário, quer dizer que temos sido bons alunos?
- Não. Quer dizer… sim… ou melhor, não. Sei lá!!
- Agora é que vai ser caçar!
- Errado, Pedro. Isto é para espalhar o bem!
- Como? Estou confuso. Percebeste Paulo?
- Ah… Não sei. Vou ligar à Maria que ela deve saber.
- À Maria ou à Manuela?
- Prestem atenção. É uma bazuca de notas. Em vez de tirarmos, vamos começar a dar.
- Mas… vamos continuar a disparar?
- Sim, e saem notas. É tecnologia americana, da mais avançada.
- Deixa-me ver se percebi, apontamos às pessoas e… toma lá euros. Será que é isto Pedro?
- Em notas, que moedas talvez aleije.
- Não, às pessoas não. Apontem aos bancos, que eles depois dão às empresas… até que há-de chegar às pessoas. Agora…
- ahahhah, ehehehe, ihiihiih, ohhho, aaahhh.
- eheh.
- Qual é a piada?
- bahahhah, eh, ihiihiih, ohhho, aaahhh.
- eheh… para Mário, não aguento mais.
- Não percebo, o que se passa?
- Nada, nada!
- Já agora podemos criar um novo banco?
- Claro que não, isso não é assim, de um dia para ou outro. Um banco tem que se construir em bases sólidas, passar por vários anos de supervisão e parâmetros apertados.
- Sim tens razão.
- Como eu dizia, agora é que vamos crescer!
- Então vá deixa lá a bazuca, as munições e podes ir Mário.
- Ciao. Cuidado com a bazuca, Pedro e Paulo. Já pensaram em fazer um dueto? Pedro e Paulo, Paulo e Pedro…
- Adeus, adeus, vai lá à tua vida, ó Mário.
- Eu vou mas tenham cuidado, que os estilhaços, provocam aumento dos preços, do gasóleo e tal.
- Eu sabia que isto não podia ser só dar! Mas ok, melhor do que nada, assim, sim. Oh Pedro não achas?
- Não sei não, então até agora foi sempre a tirar, e de repente vamos dar… aos bancos? As pessoas vão perceber?
- Pedro, nós tirámos-lhes, se agora lhes enchêssemos os bolsos, sem mais nem menos, aí sim ficavam confusas, sem saber o que fazer ao dinheiro, capazes ainda de irem esbanjar à toa. Assim não.
- Olha, abre mas é uma lata de sardinha e uma mini para comemorar.
- Sardinha? Vai ser é um bife! A ideia não é crescer? Sempre ouvi dizer que peixe não puxa carroça.
- Se há coisa que me faz confusão, é o pessoal estar sempre a querer crescer. Se crescêssemos sempre, qualquer dia não cabíamos cá.
- Tínhamos que ir para Marte.
- Bem visto! Mas isso é caro.
- O que vale é que querem, querem, mas não crescem nada de jeito. Querem, mas não sabem como, depois inventam. A seguir vem o quê? Uma bomba?
- Bora, vamos ao Talho!
- Talho? Depois ainda temos que fazer o bife e o molho.
- Não pá! Há um restaurante…

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Somos Ronalde!

A formação até é boa (ou era) mas o estágio profissional bem remunerado é lá fora, em Inglaterra, por exemplo. O sucesso mora aqui ao lado, na terra de nuestros hermanos. Lá têm condições. Lá podemos. Aqui somos podados. Gasolina mais barata, bons ordenados, bons empregos, boas empresas, boas terras. Reis, raínhas, princípes e princesas. É o paraíso. O melhor e maior clube do mundo (e o Benfica, pá?!), a melhor liga de futebol do mundo, o segundo melhor jogador do mundo no segundo melhor clube do mundo. E o 1º de dezembro continua a ser feriado?

O Ronalde é que sabe, até o grito de guerra foi espanhol! Mas ok, discursou em português, e bem, para quem quis ouvir. Falou, pronto. Quem não deve ter gostado de ouvir, foram os germânicos, já se preparavam para fazer o pleno, com um Manuel qualquer que vai à baliza, para juntar ao Joaquim macacudo e tiveram que levar com um periférico. Toma também incha Platini! Menos, que os hommes estão sensíveis: toma (só) Platini!

Três, hã!? Nem uma nem duas, são três bolas. Não foi à toa a protuberância na estátua. Possivelmente até já lá está embutida a prometida quarta. Se não está, embute-se para o ano, não seja por isso. A Irina até foge! Foi como hoje, nem vê-la. Mas é assim, mulher não é chamada para as cenas da bola. A não ser a mãe.

Agora a sério, parabéns, és sem dúvida enorme. Há mais alto, mas em termos de projeção internacional de Portugal sem ser pela avaliação económico-financeira de lixo, melhor do que tu não há. Vamos à quarta. Só é pena que o resto da malta não te consiga ajudar. Nem nós aqui, nem os teus coleguinhas de seleção que já devem estar bem fartinhos de ouvir que o bom és tu e os fraquinhos são eles. As verdades são para ser ditas, não há como contrariar quem tem um museu como o teu. Vão mas é trabalhar (se ainda têm trabalho)!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Canetas contra canhões


Um dia igual aos outros. A caneta vai escrever, marcar o papel branco, transformar o vazio, magicá-lo em realidade. Os traços vão saindo, a forma forma-se, a obra nasce. Tudo está calmo, sereno, normal, só se ouve o silêncio da escrita. Repentinamente a caneta estremece, sobressalta-se, a forma deforma-se, mas sobrevive, mesmo que desprogramada e subvertida. O alarme desperta e acorda Charlie em vigia.
Do outro lado da janela, os passos são firmes, autómatos, basilares, sustentáveis de um peso. O dos canhões em riste, do dedo embrutecido no gatilho, o olhar cego, maquinalmente seletivo e morto. O punho negro empurra a porta, nem bom dia, nem boa tarde, o dedo embrutece-se apenas mais uns milímetros e o mecanismo é acionado. Energia irreversível, combustão, clarão, estrondo ensurdecedor, o cano é percorrido, uma e outra vez. As balas rastilham o ar.
Ninguém se mexe, apenas se pensa. Os olhares fixam-se na agressão. Os estiradores abrem-se em escudos, as balas esbarram, outras passam, mas logo são abertas ao meio, numa precisão métrica infinita de folhas de papel supercortante. Dividem-se, desunem-se e caiem no chão num tilintar inofensivo. Nuvens cinzentas esboçadas no ar por lápis de carvão ofuscam a visão. As rajadas param.
Bisnagas de tinta esguicham, e os esguichos trespassam a cinza, entrelaçam-se num tronco grosso, dois ramos com mãos nas pontas formam-se e seguem na direção dos dois. Apanham-nos, imobilizam-nos, seguram-nos, elevam-se, rompem telhados e esticam-se, subindo pelo céu até ao limite do respirável, até à fronteira da morte.
A tinta de azul elétrico, irradia luz, ofusca a torre Eiffel, torna-se visível, todo o mundo a vê, milhares de metros e litros depois liquidifica-se por completo e colora o planeta numa chuva de artifício. Sem chão, os dois pares de olhos esbugalham-se. Contudo, mal vêm o mundo lá em baixo. O espaço para, o instante é breve. A queda é vertiginosa, as armas libertam-se, desintegram-se e esfumam-se na atmosfera. As vestes rompem-se, libertam-se, esfarrapam-se e balançam como folhas. Os corpos seguem incontroláveis, sugados para baixo, a velocidade é absurda, e o ar falta, mas a terra e o chão sólido e tangente estão fatalmente próximos. Não vai doer. Será fulminante. As almas seguem presas. As pálpebras fecham.
As canetas agrupam-se, no exterior, em círculo, de bico para o centro, e começam a debitar letras, que se encaixam e criam uma rede. Os olhos continuam fechados, o medo do violento e exterminante embate apodera-se, mas eis que se abrem pela captura leve e subtil da rede. As canetas apontam para baixo. A rede desmancha-se e as letras caiem no chão ao redor dos dois. Nus, despidos, depilados, limpos, indefesos, rendidos. Mas não redimidos. O olhar pasmo logo se enraivece, as canetas embicam novamente ao centro. E disparam!
Letras. Penetram no crânio, sem dor. Marcadores injetam cor. Sem dor. Lápis definem traços. Sem dor. Pinceis pintam roupas e artefactos. Sem dor.
Os dois, entreolham-se, sem capuz libertam-se. E vão comprar o jornal.

Embora assim não pudesse ser, também não se acredita que assim tenha sido. Foi. Imaginado também o será, mesmo que seja apenas isso. Escrito, expressado, acaba de o ser. O momento é de escrever.